O Brasil conta
atualmente com 197 cursos de medicina. Esse número, em constante evolução, indica
cenário nebuloso para a qualidade do ensino médico no país que, de forma
equivocada, tem privilegiado a quantidade em detrimento da qualidade. Todos os
anos essas escolas despejam perto de 17 mil novos profissionais no mercado de
trabalho, parte significativa despreparada para enfrentar o desafio da
assistência.
Em termos absolutos,
o Brasil perde apenas para a Índia em volume de escolas. Aquele país, com população
seis vezes maior que a brasileira e um perfil epidemiológico onde predominam as
doenças infectocontagiosas, tem 272 cursos de Medicina. China e Estados Unidos,
dois outros gigantes em termos populacionais e econômicos, possuem,
respectivamente, 150 e 137 centros de formação médica.
Numa análise
retrospectiva, percebe-se que o boom na abertura de escolas médicas teve início
em 1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso. Até 2002, foram inaugurados
44 novos cursos (27 privados e 17 públicos), fazendo com o total do país
pulasse de 83 para 127. Mas este foi apenas o começo. Entre 2003 e 2010, quando
Luís Inácio Lula da Silva foi presidente, passaram a funcionar outros 52 cursos
(40 privados e 12 público). Já durante a gestão de Dilma Rousseff foram
autorizados mais 17 (14 privados e 4 públicos).
Capitaneados
pelo CFM, sua entidade de representação federal, os Conselhos de Medicina têm
denunciado a abertura sem critérios dessas escolas, muitas delas sem corpo
docente qualificado, plano pedagógico, bibliotecas, equipamentos e mesmo campos
de estágio e treinamento de profissionais. Resultado de pressões exercidas por
interesses políticos ou econômicos, essas instituições de ensino, infelizmente,
não cumprem com seus compromissos junto a estudantes e à sociedade.
Tal realidade
traz a tona outro problema. O que fazer com respeito ao produto gerado por esse
sistema formador deficiente? Como evitar que esses jovens médicos coloquem em
risco a saúde de seus pacientes? Essas são perguntas que cobram respostas
urgentes das autoridades e das entidades médicas. Ressalte-se a seriedade do
tema, que, na rotina dura de hospitais e prontos-socorros, se equilibra na
linha ténue que separa vida e morte.
No âmbito do
CFM e dos CRMs, o debate é intenso. Entendem-se como necessárias a adoção de
medidas para qualificar o ensino médico no país, cujas providências têm sido
cobradas dos Ministérios da Educação e da Saúde. Entre elas, está a de avaliar
o egresso das salas de aula, recém-diplomado. No entanto, ainda não consenso
sobre qual a melhor forma de se fazer este trabalho.
Há os que
advogam a importância de um teste de fim de curso, nos moldes do exame de ordem
da OAB. Por outro lado, existe a proposta de se instituir um modelo chamado de
teste de progresso (com avaliações no segundo, quarto e sexto anos), que
envolveria alunos, professores e as escolas. Qual o caminho ideal? Ainda não
sabemos qual delas é soberana, até porque outras propostas podem surgir, mas há
uma convicção: é preciso fazer algo.
O fundamental
é que a opção se paute menos pela forma e mais pelo conteúdo. Não interessa
como a avaliação será feita, mas que ela resulte numa mudança de postura de
escolas, professores, alunos e futuros profissionais com respeito ao papel que
exercem no mundo atual e sua responsabilidade para com o bom exercício da
Medicina.
Hiran Gallo